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rua do imaginário

Porque existe algo em vez do nada?

Porque existe algo em vez do nada?

rua do imaginário

07
Jan22

Breviário do Silêncio

O silêncio não é explicável. Não só porque se furta aos princípios de articulação da linguagem, mas também porque ele é, em si e quando irrompe e se demarca do som, uma realidade e uma experiência auto-suficiente e autónoma. Qualquer tentativa de explicação da experiência (não do fenómeno!) do silêncio seria uma contradição. O silêncio propicia, em última análise, o acesso a uma «fala» do mundo e das coisas na sua radicalidade ontológica, sem explicações. É a pura presença.

 

Breviário do Silêncio, João Barrento.png

João Barrento, Breviário do silêncio, Alambique

 

03
Dez21

Devia haver um poema sobre o nosso amor

 

Devia haver um poema sobre o nosso amor

Sobre o que é tão diferente de ti e de mim: nós

Um poema sobre o nosso amor quase perfeito

Que está para além do tempo e do espaço

Que está para além do corpo e da alma,

Que está para além da palavra e do silêncio

Que antes de nós sempre existiu, em algum lugar secreto

Que depois de nós sempre irá existir, em algum lugar secreto

Que possui a essência do infinito

 

O nosso amor é quase perfeito

Só que devia haver um poema sobre o nosso amor

Porque ao nosso amor só lhe falta um poema para ser perfeito

 

 

Inspirado no poema de Eduardo Chirinos, "Fragmentos de una alabanza inconclusa"

 

26
Nov21

A viagem acabou

 

Não é verdade. A viagem não acaba nunca. Só os viajantes acabam. E mesmo estes podem prolongar-se em memória, em lembrança, em narrativa. Quando o viajante se sentou na areia da praia e disse: “Não há mais que ver”, sabia que não era assim. O fim de uma viagem é apenas o começo doutra. É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na primavera o que se vira no verão, ver de dia o que se viu de noite, com sol onde primeiramente chuva caía, ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e para traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já.

José Saramago, Viagem a Portugal

 

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19
Nov21

Regresso

Juromenha é um local mágico. O seu forte, hoje degradado e decadente, tem a beleza que só os locais abandonados conseguem transmitir, nas pedras das ruínas imaginam-se e sentem-se as centenas de anos de História, de batalhas e de tragédias, de uma fortificação que foi evoluindo com os tempos desde o castelo medieval de origem árabe até à fortaleza abaluartada das batalhas da restauração da independência de Portugal. Sobranceira ao Guadiana, permite desfrutar de uma paisagem fabulosa sobre o azul tranquilo das águas do Guadiana e as planícies verdes a perder de vista. Infelizmente, no momento da nossa visita não foi possível de usufruir da profundidade mágica do silêncio destas paisagens pois um esforçado motor de rega ronronava no lado espanhol do rio e interrompia o feitiço do silêncio.

 

Depois de Juromenha a rota deste último dia de Ronda Alentejana era de regresso a casa. Não sem antes passarmos pela bonita Vila Viçosa, onde percorremos de mota as suas ruas e admirámos o sempre impressionante Paço Ducal, e de uma paragem retemperadora numa esplanada no Alandroal junto do seu castelo. O almoço foi em Évora, no mesmo local de refeições vegetarianas onde tínhamos almoçado no primeiro dia desta viagem. Estava assim fechado o círculo da Ronda Alentejana.

 

A nossa viagem terminou. Na realidade a viagem não terminou ali nem naquele dia. A viagem segue viva muito tempo depois de estarmos de regresso a casa. A lenta e meticulosa construção de memórias, a partilha de experiências, a nostalgia dos momentos vividos, e até o que ficou por ver, tudo isto é viagem também e tudo isto perdura em nós.

 

Mais que uma viagem, foi uma viagem a dois. Uma construção partilhada, um gesto de amor mútuo. Esta viagem, esta Ronda Alentejana, existe, agora e sempre, dentro de nós os dois. Nós também somos esta viagem.

 

As viagens são os viajantes. O que vemos, não é o que vemos, senão o que somos.

Bernardo Soares, Livro do Desassossego

 

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A beleza do abandono de Juromenha

 

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A sentinela do Guadiana

 

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Paço Ducal de Vila Viçosa

 

 

12
Nov21

On a clear day you can see forever

O dia iniciou-se com a pequena ligação entre Moura e a Barragem do Alqueva, onde fizemos uma paragem para voltar a saudar o Guadiana que nos últimos dias tem sido companhia habitual na paisagem que percorremos, agora em formato de enorme e tranquilo lago. Junto dos muros da barragem uma instalação artística de João Louro coloca em grandes letras de metal ferrugento a seguinte frase:

 

On a clear day you can see forever

 

Não é claro que a escolha desta frase pelo artista esteja associada ao poema da música com o título semelhante. Estando ou não, encontra-se um sentido entre esta frase naquele local com o poema de Alan Jay Lerner, uma elegia à harmonia entre o “eu” e o mundo que nos rodeia, a grandeza, a beleza e a unidade de todas as coisas do Universo.

 

On a clear day
Rise and look around you
And you'll see who you are
On a clear day
How it will astound you
That the glow of your being outshines every star

You'll feel part of every mountain, sea, and shore
You can hear from far and near a world
You've never-ever heard before

And on a clear day
On that clear day
You can see forever and ever

 

Seguimos depois em direção à Aldeia da Estrela, típica aldeia alentejana, antes perdida na planície infindável agora uma povoação nas margens de um infindável lago azul. Chegamos à Estrela através de uma paisagem de vinhas a perder de vista, atravessamos a aldeia, branca, silenciosa e deserta como todas as aldeias no Alentejo, e dirigimo-nos de imediato para as margens do lago. Estamos ainda a desmontar da mota quando somos surpreendidos pelo fabuloso voo de um bando de flamingos sobre as águas do Guadiana. Extraordinária coincidência esta a de sermos recebidos na Aldeia da Estrela pelo espetáculo da natureza do voo dos flamingos. Local de tranquilidade absoluta, de beleza incomparável, com a aldeia caiada de branco na margens de um espelho de água aqui e ali pontuado de pequenas ilhas de montado alentejano, com o azul do lago e o azul do céu a unirem-se suavemente. Este foi um dos locais que mais nos marcou nesta ronda alentejana.

 

Saímos da Estrela, que nos deixou um brilho perpétuo na memória, e retomamos a nossa rota raiana rumo a norte. A paragem seguinte foi Mourão. Foi esmagados por um sol abrasador de meio-dia que visitámos o seu curioso castelo, onde a igreja foi incorporada nas suas muralhas e com uma vista fantástica sobre o lago do Alqueva. Deixámos o castelo ansiosos por uma sombra e estacionámos a mota numa praça da vila de Mourão onde, para nossa surpresa, encontrámos um restaurante com opção vegetariana. Decidimos almoçar logo ali e não nos arrependemos em nada. Mais um vez foi possível fazer uma saborosa refeição vegetariana no mais profundo Alentejo.

 

Se nos últimos quilómetros temos vindo a viajar ao longo da fronteira iríamos agora atravessar para o lado de lá dessa linha no mapa e entrar em Espanha. O objetivo é visitar Olivença (ou Olivenza), a famosa povoação que foi sendo espanhola e portuguesa ao sabor de diferentes acordos entre os reinos de Portugal e Castela. Em 1297, no reinado de D. Dinis, o Tratado de Alcanizes traçou fronteiras ainda hoje em vigor, acordando como sendo portuguesas localidades como Campo Maior, Almeida ou Castelo Rodrigo, e estabelecia também Olivença como sendo parte de Portugal. Olivença foi considerado território espanhol somente em 1801 na sequência do Tratado de Badajoz, assinado já sobre a sombra negra das invasões francesas. Durou pouco tempo este tratado, dado que foi devolvida a soberania de Portugal sobre Olivença no Congresso de Viena em 1815 que redesenhou as fronteiras europeias no rescaldo do domínio de Napoleão. Mas a entrega de Olivença a Portugal nunca foi cumprida e até aos dias de hoje a soberania não foi devolvida. Agora, numa época em que, felizmente, as fronteiras políticas na Europa deverão ser cada vez mais linhas imaginárias, já não fará muito sentido questionar de que lado da fronteira deveria Olivença estar.

 

Chegámos a Olivença sobre um calor intenso e em pleno período de siesta. A cidade encontrava-se deserta, nem uma alma na rua, nem um comércio a funcionar. Percorremos várias ruas e praças do que parecia ser uma cidade fantasma, até encontrarmos um restaurante junto do ayuntamento com uma pequena esplanada onde nos sentámos para uma bebida refrescante. Eram cerca de cinco horas da tarde em Espanha e fomos assistindo ao lento despertar vespertino da cidade, como que a sacudir-se do sono e a regressar devagar à vida: uma loja de tatuagens que abre, ao seu lado abrem-se as portas de um pequeno cabeleireiro, vão chegando algumas clientes. Lentamente o movimento vai regressando às ruas e a cidade fantasma retoma a sua vida.

 

Olivença é uma cidade bonita, bem cuidada, com as casas impecavelmente brancas e de ruas tranquilas, limpas, decoradas com laranjeiras de copas impecavelmente redondas.  Demos um pequeno passeio a pelas ruas de Olivença e visitámos a Capela de Espírito Santo, capela fundada no século XVI pela Misericórdia de Olivença, com o interior completamente decorado com bonitos azulejos portugueses que datam de uma reforma da igreja realizada no século XVIII.

 

O destino da jornada seria a cidade de Elvas onde chegamos passando a fronteira junto da antiga Ponte da Ajuda sobre o rio Guadiana. Aqui já o Guadiana retomou a função de fronteira natural e entramos em Portugal regressando à sua margem direita, cruzando nesta ronda este rio pela última vez e abandonando definitivamente o Além-Guadiana. Depois de instalados no nosso alojamento, nos arredores de Elvas, e como o calor que se fazia sentir ainda era intenso foi possível usufruir de um refrescante mergulho na piscina do alojamento ao fim da tarde. O jantar foi na cidade de Elvas, onde não foi nada fácil encontrar uma restaurante com opções vegetarianas. O único local que as tinha listadas na ementa estava completamente lotado. Depois de calcorrearmos várias ruas, de visitarmos as muralhas da fortaleza de Elvas e apreciarmos as vistas sobre os Fortes de Santaluzia e o de Nossa Senhora da Graça à luz do pôr-do-sol, foi finalmente possível encontrar local para a nossa refeição. Uma moderna pizzaria resolveu o nosso jantar, apesar de ser um estabelecimento que estava nos primeiros dias de funcionamento e de nos ter sujeitado a uma enorme demora para podermos saborear a nossa refeição.

 

Esta era a última noite da nossa Ronda Alentejana. No próximo dia seria o regresso a casa.

 

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Flamingos na Estrela

 

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Guadiana blues

 

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Olivença, hora da siesta

 

 

29
Out21

Além-Guadiana

Iniciamos a jornada saindo de Alcoutim em direção a norte, afastando-nos temporariamente das margens largas e suaves do Guadiana e usufruindo de estradas tranquilas emolduradas pela paisagem levemente ondulada. Na passagem pela bonita vila de Mértola fazemos uma breve paragem e aproveitámos para abastecer as malas da mota com umas sandes e umas bebidas para o almoço e retomamos a viagem atravessando o rio Guadiana junto de Mértola. Na margem esquerda do rio tem-se uma bela perspetiva de Mértola, com as suas muralhas empoleiradas sobre o Guadiana.

 

Aqui o rio Guadiana é bastante mais estreito e as suas margens mais rochosas escarpadas do que quando o deixámos, há uns momentos, em Alcoutim. Poucos quilómetros a norte de Alcoutim, numa inflexão do rio e por circunstâncias da história, o Guadiana deixa inopinadamente de ser a fronteira natural com Espanha. E agora, depois de cruzar o rio em Mértola, estamos na sua margem esquerda e continuamos a viajar em território português, em terras de Além-Guadiana. Foi junto da localidade de Minas de São Domingos, na praia fluvial da Tapada Grande, que fizemos uma relaxada merenda com base nos mantimentos armazenados na mota. Após a refeição retomou-se a viagem sem novidades, sempre rumo a norte e junto à raia, a cruzar as estradas calmas do Alentejo. Na localidade de Safara fazemos uma breve pausa, no calor intenso da tarde. O nosso alojamento do dia seria em Moura e teríamos de decidir se íamos visitar Barrancos, o que, estando em Safara, significa uma viagem de 40 km em cada sentido. Barrancos é das localidades mais isoladas deste país, é o arquétipo português da povoação isolada, sendo que a localidade portuguesa mais próxima, Santo Aleixo da Restauração, dista 21 quilómetros de Barrancos. Decidido que iríamos a Barrancos, voltámos a meter rodas à estrada.

 

A ligação entre Safara e Barrancos pela N258 é um fantástico percurso para se usufruir de mota. Curvas bem delineadas a navegar entre a ondulação da paisagem, com bom piso e trânsito quase nulo. Apesar da tarde muito quente de agosto foi um enorme prazer conduzir neste percurso que permitiu momentos de total imersão na alegria superior que é viajar de mota. E foi assim que, no que nos pareceu um instante, chegamos a Barrancos, vila caiada de branco, de casas aglomeradas, ruas estreitas, cuidadas e orgulhosas. Estava uma tarde muito quente e o sol ainda seguia alto, dirigimo-nos para o centro da vila e estacionámos a mota à sombra da igreja paroquial. O calor não convidava a passeios pedestres e assim a nossa paragem resumiu-se a um tempo de descanso na esplanada de uma pequena tasca junto da praça. Era necessário decidir o nosso próximo destino. Na ideia inicial da viagem estava previsto visitar o castelo de Noudar, a cerca de 12 quilómetros de Barrancos. Mas, erro nosso, ao ler os comentários assustados de outros visitantes do castelo, ficámos a saber que o percurso até lá é através de uma picada de terra batida de uns longos 8 quilómetros em cada sentido, aparentemente nem sempre em bom estado. O calor intenso e o risco de sofrer um furo acabou por ter o seu peso e foi decidido que não se iria a Noudar.

 

O espaço para a ucronia, a imaginação sobre o que poderia ter acontecido mas que não aconteceu realmente, também é parte integrante do mistério de cada viagem. Se o que aconteceu é memória, o que não aconteceu, mas podia ter acontecido, é silêncio. E o silêncio também é belo. O Castelo de Noudar é o momento de silêncio da viagem, o momento de todas as possibilidades, quando naquela tarde quente numa sombra de Barrancos foi decidido não ir a Noudar. Mas há algo que ficou definido: noutro tempo estes viajantes irão a Noudar.

 

Na saída da vila seguimos, por um mero acaso da decisão algorítmica do GPS, por uma estrada diferente da que tínhamos percorrido na chegada e passamos por um local muito belo: o Baloiço de Ferrenha. Uma vista enorme sobre a planície enrugada destes territórios avistando-se ao longe a mancha branca do casario de Barrancos. E ouvia-se o silêncio. Silêncio que foi brevemente interrompido por duas mulheres que aparecem num automóvel, saltam lá de dentro, tiram duas ou três fotografias sem tão pouco olhar para a paisagem e, tão depressa como chegaram, voltam a entrar em furacão na viatura desaparecendo a alta velocidade. Depois de partirem, regressou o silêncio.

 

A ligação entre Barrancos e Safara volta a proporcionar o mesmo prazer de condução da ida. Sem dúvida que esta é uma estrada que deixa muitas saudades. Depois de Safara uma longa e aborrecida reta leva-nos até ao destino deste dia de viagem, Moura. O Hotel de Moura revelou-se uma surpresa, um interessante edifício a nível arquitetónico, belamente revestido a azulejos e com um interior de nítida influência árabe, incluindo um belíssimo pátio central. Moura é uma cidade muito interessante, que nos surpreendeu pela sua dimensão, muito arranjada com as casas caiadas cuidadosamente decoradas com vasos floridos. Não foi no entanto simples encontrar um restaurante que servisse uma refeição vegetariana, mas lá se encontrou um local, a Taberna do Liberato, junto ao castelo, que nos apresentou uns petiscos e umas saladas que resolveram o problema.

 

É impossível passear em Moura sem nos depararmos de alguma forma com a lenda da moura Salúquia. Não poderia deixar aqui de referir esta lenda que estará na origem do atual nome da cidade e que nunca foi esquecida pelos seus habitantes. Segundo a lenda, a moura Salúquia, governadora da cidade, apaixonou-se por Bráfama o alcaide mouro de Aroche, uma localidade raiana que fica no que hoje é a Andaluzia. Nas vésperas do matrimonio Bráfama dirigia-se com a sua comitiva para se juntar a Salúquia. Os cavaleiros cristãos encarregues por D. Afonso Henriques de conquistar o castelo, estando a par dos preparativos da boda de Salúquia, emboscaram Bráfama na viagem e derrotaram a sua comitiva árabe. Os cavaleiros cristãos vestiram as vestes árabes e dirigiram-se para o castelo, onde Salúquia esperava ansiosamente a chegada do seu apaixonado. Salúquia, do alto da torre do castelo, vendo aproximar-se um grupo, que aparentemente era de árabes, ordenou de imediato que as portas do castelo fossem franqueadas para receber o seu esperado Bráfama. Tomados de surpresa os defensores do castelo, foram imediatamente atacados e facilmente vencidos pelos cavaleiros cristãos. Apercebendo-se do que estava a acontecer e, na certeza de que o seu apaixonado estaria morto, Salúquia atirou-se do alto da torre. Apesar da crueldade do ataque traiçoeiro, os conquistadores ficaram comovidos com a história do amor de Salúquia e renomearam a povoação para Terra da Moura.

 

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Mértola

 

 

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Ferrenha, com paisagem sobre Barrancos

 

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Rua de Moura

 

 

20
Out21

Transalgarve

A noite foi quente no alojamento de Silves, apenas suavizada pelo sopro de uma pequena ventoinha, que pouco conseguiu fazer para amenizar a temperatura, mas a manhã estava luminosa e fresca.  Um refrescante pequeno almoço na bonita Praça do Município, junto do pelourinho e das magníficas portas da cidade, serviu na perfeição para recuperar do cansaço provocado pelo calor tórrido do dia anterior. Depois de colocada a bagagem na mota, partimos para o nosso objetivo do dia: percorrer a estrada N124 e chegar a Alcoutim, junto ao Guadiana e já na fronteira com Espanha. A estrada N124, tal como a famosa N125 que no litoral e de forma confusa, fumarenta, barulhenta, repleta de rotundas e semáforos, atravessa longitudinalmente o Algarve, só que esta fá-lo pelo interior, sempre algo hesitante entre a serra e a planície. São estradas irmãs, mas enquanto a N125 só pode ser um pesadelo a N124 tem tudo para ser um sonho.

 

Na parte inicial do nosso percurso, ainda no barlavento algarvio, a N124 é ladeada por enormes plantações agrícolas, geralmente árvores de fruto, maioritamente laranjeiras que produzem a famosa laranja do Algarve. Depois de São Bartolomeu de Messines, Alte, Benafim e Salir são as principais povoações algarvias que atravessamos neste trecho da estrada, nomes que nos remetem novamente para a forte herança árabe destes territórios. Estamos em pleno barrocal algarvio, paisagem encravada entre as elevações da serra Algarvia e a planície litoral.

 

Conforme vão decorrendo o quilómetros as povoações tornam-se escassas e o percurso começa a adentrar-se na zona montanhosa da serra do Caldeirão. Agora a estrada enche-se de curvas, a paisagem de verde e torna-se um verdadeiro prazer conduzir por aqui. Na localidade de Barranco Velho a estrada N124 cruza-se com a nossa conhecida do dia anterior, a N2. E é a partir daqui que a N124 perde o definitivamente o medo da serra e se lança decidida sobre a geografia de montanha do Caldeirão, infletido o seu percuro para nordeste. Até Martinlongo esta estrada é um percurso de montanha muito belo, a serpentear entre paisagens verdejantes e com raras e quase abandonadas povoações.

 

Já próximo de Alcoutim, quando deixamos a serra e retomamos novamente a planície, temos oportunidade de conhecer a mais moderna produção destes terrenos algarvios: as estações solares de produção de energia eléctrica. Centenas de hectares preenchidos com milhares de paineis solares que, quais enormes girassóis mecânicos, acompanham o Sol num movimento lento, suave e sincronizado. Nos próximos dias este mosaico de painéis escuros e brilhantes, esta agricultura elétrica, será várias vezes nossa companhia na paisagem, o que demonstra que é um negócio a florescer por estes terrenos. Entre o abandono e a produção de energia verde, até parece ser uma boa utilização para estas desertas planuras ensolaradas.

 

Chegamos a Alcoutim ainda antes de almoço. Durante a viagem transalgarvia apenas sentimos necessidade de parar por alguns minutos numa pequena zona de descanso com vista para as montanhas. Estava assim percorrida a estrada N124, que deixou saudades. Estamos agora nas margens do Guadiana, com Espanha na outra margem. Dirigimo-nos de imediato ao hotel, mesmo junto ao rio, e enquanto aguardamos que o quarto estivesse disponível almoçamos no restaurante do hotel umas agradáveis saladas, os únicos pratos vegetarianos aqui disponíveis.

 

Depois de algum tempo de descanso no hotel durante as horas de maior calor, voltamos a montar na mota e percorremos a estrada M507, que acompanha a margem direita do Guadiana, em direção a Sul até Foz de Odeleite. Uma estrada bonita que serpenteia como o rio e com este sempre à vista. Nestas paragens o Guadiana é um rio largo e tranquilo, e por esta altura pontilhado por dezenas de pequenos veleiros, uns a subir desde a foz em Vila Real de Santo António, outros a regressar em direção ao mar e muitos outros simplesmente ancorados ao longo do rio. A partir da Foz de Odeleite a estrada afasta-se das margens e deixa de ser a companhia do Guadiana. Fazemos aí meia-volta e regressamos pelo mesmo caminho, mas sem antes  pararmos para uma pausa na povoação com o poético nome de Guerreiros do Rio, onde numa esplanada mesmo junto ao rio foi possível petiscar e beber algo refrescante num fim de tarde maravilhoso.

 

O jantar foi numa esplanada no centro de Alcoutim. Por falta de opções vegetarianas o recurso foram uns petiscos e umas pizzas, e a refeição acabou por ser bastante agradável, numa bela noite de calor suave.  A esplanada estava localizada junto ao rio e mesmo em frente da localidade de Sanlúcar do Guadiana, a vizinha espanhola de Alcoutim na margem esquerda do rio. Uma localidade que, vista deste lado do rio, se mostra impecavelmente branca, com uma hamonia fabulosa com a paisagem, o casario a subir do rio e encaixado nos suaves vales das colinas na margem. Com o cair da noite acendem-se as luzes e este pueblo blanco transformou-se agora num maravilhoso presépio ribeirinho. Soam as badaladas na igreja de Sanlúcar, com uma badalada extra à hora que faz deste lado do rio. Felizmente que os sinos da igreja de Alcoutim não repicaram também, senão a confusão de badaladas e horários seria grande em ambas as margens. Apenas alguns metros de rio separam as duas povoações, e os dois fusos horários, mas mais que separar, aqui o Guadiana une, pois barqueiros garantem o transporte constante de passageiros entre as duas margens, fazendo em poucos segundos o que por estrada é uma viagem de quase 80 quilómetros. O rio Guadiana será nossa companhia quase constante nos próximos dias, em que vamos iniciar, rumo a norte, um percurso que nunca nos afastará muito das margens deste rio tão singular, que sabe ser, em pouca distância, largo e tranquilo, estreito e revolto e, ainda que pela intervenção do Homem, um enorme lago azul.

 

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Serra do Caldeirão, pela N124

 

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Rio Guadiana, entre Alcoutim e Foz de Odeleite

 

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Sanlúcar do Guadiana, vista de Alcoutim

 

07
Out21

Rumo a Sul

Vamos nesta segunda etapa da ronda rumar diretamente a Sul. Fazer a travessia do Alentejo e entrar no reino do Algarve, pelas típicas estradas alentejanas, estreitas e com escasso movimento, longas retas pontualmente interrompidas por umas poucas curvas quando se cruza algum rio ou ribeiro: curvas a descer em direção à linha de água, uma pequena ponte lá no fundo, mais umas curvas a subir e retomamos a planície ondulada, que nestes dias nos apresenta um restolho seco com bonitos tons de um suave dourado. De longe em longe, a paisagem é acrescentada com alguma aldeia ou vila, umas em que a estrada cruza o âmago da povoação, outras em que se vê o povoado caiado de branco ao longe e que a estrada contorna. Com o passar dos quilómetros encontramos um certo ritmo nestas estradas, como uma música, como uma dança.

 

Saímos do hotel junto aos Almendres e seguimos de imediato em direção a Santiago do Escoural. Passamos ao lado das grutas que pretendíamos visitar na véspera, mas que nesta viagem não iria ser possível. Não há problema, estes viajantes são pacientes e podem sempre regressar noutro tempo (José Saramago, em “Viagem a Portugal” refere-se a ele próprio como “o viajante”, e esta é uma descarada apropriação, em forma de homenagem, que o contexto justifica e desculpa). Junto a Santiago do Escoural entramos na agora mítica N2, a estrada mais longa do país, que rasga o interior de Chaves a Faro. Este é o troço do Alentejo profundo da N2 que que nos vai levar até Almodôvar onde iremos mudar de direção para oeste, no sentido das montanhas de Monchique. O nosso destino final: Silves.

 

Ainda antes de abandonar a N2 era necessário resolver a questão do almoço. A percorrer o interior alentejano, com escassas e pequenas povoações, não é fácil, senão impossível, encontrar um restaurante que se preocupe com questões vegetarianas. Por acaso, passamos junto a Aljustrel por um supermercado ao lado da estrada, paramos de imediato, abastecemos de mantimentos para uma refeição e continuamos viagem, agora com os sentidos em se encontrar um local aprazível para o nosso piquenique. Alguns quilómetros à frente, na aldeia de Rosário, reparamos junto à estrada num pequeno parque infantil com sombra e duas ou três mesas. E foi ali, no Rosário, que fizemos o nosso piquenique. Mesmo em frente, do outro lado na N2, um restaurante permitiu-nos finalizar a refeição com um café na esplanada.

 

Foi antes de entrar em Almodôvar que infletimos o rumo em direção a Monchique. Abandonamos a N2 e entramos numa estreita estrada, a N393, que cruza curvilínea montes desertos. Um estrada muito interessante, de piso degradado mas a proporcionar grande prazer de condução, atravessando uma paisagem montanhosa, seca e de escassa vegetação. A suavidade da planície alentejana dava agora lugar a uma ondulação encrespada, como se o chão anunciasse tempestade.  Este troço da N393 terminou depressa demais, pelo prazer que proporcionou, e em pouco tempo estávamos na IC1, onde percorremos alguns quilómetros até à viragem em direção a Monchique. E estamos agora novamente em plena estrada de montanha, a N267, atravessando a Serra de Monchique. Estrada muito retorcida, com uma paisagem verde, de vegetação mais intensa e frondosa, mas igualmente deserta de povoações. Impressiona a rugosidade aguda destes montes e a quantidade de quilómetros que percorremos, já em pleno Algarve, sem encontrar qualquer sinal de povoações ou de pessoas.

 

Monchique, com as suas termas e a famosa água, foi vista apenas de passagem e subimos de imediato ao alto da Fóia, o ponto mais elevado do Algarve, com os seus 902 metros de altitude. Deste local consegue-se ver, para norte, o enrugado da serra que separa o Algarve das planícies do Alentejo e, olhando para sul, uma vasta extensão do litoral algarvio, que por estes dias estivais estava certamente a fervilhar de veraneantes, que de férias fogem da aglomeração urbana para se aglomerarem junto ao mar. Para nós, na altitude do alto da Fóia, tudo parecia tranquilo e o silêncio enganador, apenas acompanhado pelo som do vento quente que soprava, escondia a agitação do turismo balnear do litoral algarvio.

 

Após um momento de descanso chegou a hora de descer da Fóia e rumar a Silves. Nesta altura o calor foi verdadeiramente incomodativo, o ar escaldante do interior algarvio soprava um bafo tórrido. Foi, durante toda a ronda, a altura em que o calor mais se fez sentir. Antes de chegar a Silves percorremos o início da estrada N124, que seria a nossa companheira para o dia seguinte. Depois de alguma dificuldade em encontrar o local do alojamento que estava reservado no centro histórico, a poucos metros da Sé e do Castelo, e se conseguir ter acesso à chave, finalmente entramos nos alojamentos. Era uma casa minúscula, com três pisos, cada um deles muito pequeno e uma escada apertada, a fazer lembrar estarmos embarcados em algum navio mercante. Recorda-nos de como os critérios de habitação mudaram: há poucos anos esta habitação seria suficiente, e foi-o certamente, para ser o lar de uma família alargada. Neste fim de tarde o calor dentro da casa era insuportável, sendo que no último piso, onde se encontrava a casa de banho e o terraço, era verdadeiramente um forno. Para suavizar o inferno apenas umas ventoinhas ao nosso dispor, que pouco conseguiam ajudar.

 

Por estes dias realizava-se e Silves um animado festival medieval de cultura árabe. Concertos, desfiles de figurantes vestindo roupa árabe, teatro, danças, de tudo um pouco animava as ruas de Silves, repletas de turistas. É curioso como a cultura árabe é celebrada por estas terras, onde parece ter mantido uma influência superior a outras zonas do país. Na altura do domínio árabe foi uma imponente cidade do al-Gharb al-Andaluz denominada de Xelb (ou Xilb) e comprável em importância a Sevilha ou Córdova.  Na visita ao belo castelo de Silves, construído numa pedra em tons de vermelho quase parecendo feito de tijolo, destaca-se na entrada a estátua de D. Sancho I, o primeiro rei cristão a conquistar este castelo aos mouros, em 1189. Talvez, e pela importância que aqui tem a herança árabe, mais justo seria que a estátua fosse do califa almóada Al-Mansur que reconquistou Silves dois anos depois (sendo que foi conquistada definitivamente aos mouros em 1242, no reinado de D. Afonso III). O castelo está muito bem conservado e é um monumento vivo, com exposições com vários artefactos, ruínas árabes, uma bonita cisterna e uma esplanada onde, naquele dia, se podia assistir a uma reconstituição de uma feira medieval e se preparava um concerto de música árabe.

 

Nessa noite o jantar foi na esplanada de num restaurante vegetariano, mais uma boa surpresa, localizado numa das estreitas e movimentadas ruas de Silves. Depois do jantar subimos ao terraço da nossa casa ardente e ficámos algum tempo a apreciar o céu noturno, a apanhar um pouco do ar fresco daquela noite de verão e a ouvir um rumor de música que nos chegava do concerto que decorria no castelo. Ao finalizar a noite ainda nos foi possível ver uma fugaz mas brilhante estrela cadente a cruzar os céus, talvez um bom prenúncio para o dia seguinte.

 

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Vista do Alto da Fóia

 

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Rua de Silves, junto da Sé

 

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Entrada do Castelo de Silves com estátua de D. Sancho I

 

 

24
Set21

Origens

 

Todo o viajante tem o direito de inventar as suas próprias geografias.

José Saramago, Viagem a Portugal

 

No percurso que foi delineado no mapa digital por terras do interior alentejano e algarvio, nessa fase de preparação que é tão genuinamente viagem como o momento em que finalmente se fecha a porta de casa, haviam dois receios que nos preocupavam: o calor que teríamos que enfrentar ao atravessar aquelas planícies tórridas em pleno mês de Agosto e tentar manter uma alimentação vegetariana percorrendo as pequenas aldeias e vilas em pleno território do porco preto. Se estas preocupações seriam um verdadeiro problema não o sabíamos quando, naquela manhã azul de Agosto saímos de Lisboa, rumo a Sul, para a etapa inaugural desta ronda.

 

A primeira paragem foi em Évora, onde chegámos tranquilamente fazendo o percurso quase todo por autoestrada. Se, relativamente ao calor, os receios se fizeram sentir enquanto percorríamos as ruas de Évora sobre um Sol alto e escaldante, foi com alguma surpresa que descobrimos existir um restaurante vegetariano dentro das muralhas da cidade, que nos proporcionou uma bela refeição numa tranquila esplanada. Começámos por visitar a rua que foi a inspiração para o nome deste blogue, a estreita “Rua do Imaginário”. É, aliás, um exercício sempre estimulante prestar atenção aos curiosos nomes das ruas nesta cidade.

 

Visitámos o centro histórico, e é sempre um prazer lá regressar, a cada visita algo de novo sempre se encontra. Surpreendeu a quantidade de turistas que percorriam a cidade de forma descontraída, quase a fazer esquecer os tempos de pandemia. No convento de S. Francisco, com origens no século XII, e que terá sido o primeiro convento franciscano em Portugal, visitámos a sua bela igreja e a famosa Capela dos Ossos, com a célebre frase na entrada, “Nós ossos que aqui estamos pelos vossos esperamos”. Um monumento à transitoriedade da vida, à superficialidade das nossas urgências, mas bastante macabro. Para nos recordarmos da nossa insignificância, não deveríamos ter que visitar a Capela dos Ossos, nem ser confrontados com as caveiras dos que nos antecederam: em cada momento, em cada instante, devemos ter em nós o pensamento da impermanência e a premência de usufruir o agora. Neste convento visitámos também um pequeno e interessante núcleo museológico de arte sacra e depois, como não podia deixar de ser, fomos visitar o templo romano de Évora.

 

O início da Ronda Alentejana foi delineado com o objetivo de visitar dois vestígios dos nossos antepassados nos territórios de além-Tejo: as pinturas rupestres da gruta do Escoural e o Cromeleque do Almendres. Por uma infeliz coincidência a gruta do Escoural encontrava-se fechada para uma intervenção anual precisamente neste dia em que estava planeado passarmos por Santiago do Escoural. Restava ir ao Cromeleque dos Almendres, que fica nas imediações da pequena aldeia de Nossa Senhora de Guadalupe. Para o alcançar é necessário percorrer um troço de quatro quilómetros de terra batida e pedra solta, o que numa mota de turismo obriga a prudência na condução e alguma sorte para não se ter algum percalço, o mais provável dos quais seria um furo. Mas lá chegámos sem novidades.

 

O cromeleque foi utilizado ao longo de vários milénios, sendo que se estima que o início da sua utilização tenha sido há cerca de 7 a 8 mil anos. Nunca poderemos saber quais os motivos que levaram estes Homens a erguer e a alinhar numa geometria com propósito, e com grande esforço, um conjunto tão grande de rochas. Quem o fez questionava-se sobre o funcionamento do Universo, iniciava a compreensão das leis do mundo e pensava certamente sobre a sua pequenez perante a imensidão do mundo. Nunca saberemos as motivações destes construtores, mas num período em que o Homem estava na transição de uma sociedade de caçadores-recolectores para uma sociedade agrícola talvez o cromeleque fosse uma mistura de calendário, pelo alinhamento dos menires com o Sol e a Lua em determinadas estações do ano, com uma prece a algo superior. Muito nos separa daqueles que alinharam estas pedras, mas muito mais nos une: o espanto perante o Universo.

 

Cromeleque dos Almendres, Templo Romano e Igreja de São Francisco. Três construções separadas por alguns quilómetros e vários milénios, que traduzem algo em comum a toda a humanidade: o reconhecimento da nossa insignificância, a humildade perante o maravilhoso e a dúvida primordial sobre o motivo de existir algo.

 

Dirigimo-nos depois para o nosso alojamento, muito perto do cromeleque, um pequeno e belo hotel de campo, isolado nos montes alentejanos num ambiente de profunda tranquilidade. Como chegámos ao alojamento ainda o Sol estava alto, foi possível usufruir de um mergulho na piscina do hotel, belissimamente enquadrada com a paisagem do montado alentejano circundante. O jantar foi no próprio hotel, no alpendre do restaurante do hotel, uma maravilhosa noite de verão, uma refeição leve e um vinho fantástico, um inesquecível jantar a dois, com a companhia perfeita no ambiente perfeito. Uma extraordinária conclusão para um dia fabuloso.

 

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Rua do Imaginário, Évora

 

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Templo Romano, Évora

 

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Cromeleque dos Almendres

 

 

 

10
Set21

FAQS

Acontece-te
acordares antes do teu braço acordar?
Alguma vez te ligaram para vender silêncio?
Para onde vão as palavras
assim que as soltas no ar? Retiras a crosta à ferida
para manter a
dor acesa? Por quanto mais tempo haverá
ignorantes
no poder? O amor é vermelho ou
também existe em preto? A rotina que satura é
a mesma que protege? Comprar tempo
num parquímetro
permite viver mais tempo? Se o gato te arranha
aproveitas para ler a
glicemia? Ao terminares a viagem há
uma placa com o teu nome? Se Deus fosse mulher
teria descansado ao domingo? Pensa bem: se Deus fosse
mulher teria descansado
ao domingo?


João Luís Barreto Guimarães, Movimento

 

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