Depois da tempestade
Odda, Noruega, 2010
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Odda, Noruega, 2010
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito
David Mourão-Ferreira, in 'Cancioneiro de Natal'
Primeiro vem a imaginação depois vem a concretização. O Homem só faz aquilo que imagina, tudo o que se construiu existiu primeiro no imaginário e só depois na realidade. E portanto, imaginar e acreditar são das atividades mais dignas a que um Homem se pode dedicar, são as raízes de tudo o que existe.
Para além da curva da estrada
Talvez haja um poço, e talvez um castelo,
E talvez apenas a continuação da estrada.
Não sei nem pergunto.
Enquanto vou na estrada antes da curva
Só olho para a estrada antes da curva,
Porque não posso ver senão a estrada antes da curva.
De nada me serviria estar olhando para outro lado
E para aquilo que não vejo.
Importemo-nos apenas com o lugar onde estamos.
Há beleza bastante em estar aqui e não noutra parte qualquer.
Se há alguém para além da curva da estrada,
Esses que se preocupem com o que há para além da curva da estrada.
Essa é que é a estrada para eles.
Se nós tivermos que chegar lá, quando lá chegarmos saberemos.
Por ora só sabemos que lá não estamos.
Aqui há só a estrada antes da curva, e antes da curva
Há a estrada sem curva nenhuma.
Alberto Caeiro
Lisboa, 2016
Há sentimentos que não são possíveis de partilhar, não há palavras suficientemente poderosas para representar o que sente a alma, não há símbolos que possam projetar uma sombra que seja da realidade. As palavras foram inventadas para motivos práticos, para as minudências do dia-a-dia, só os poetas lhes conseguem ocasionalmente extrair o sentimento para que não foram feitas, como o escultor extrai a estátua do bloco de pedra. Nesses momentos, os que não têm alma de poeta estão irremediavelmente confinados com seus sentimentos, isolados do Universo, sozinho, o Homem e as suas circunstâncias. É nestes momentos que o corpo chora.
A vida é feita de escolhas. Mas nesta sociedade de consumo, em que somos induzidos a que podemos ter tudo, em que temos o direito a ter tudo, há algo fundamental que fica esquecido: é que escolher é em primeiro lugar abdicar. Não podemos querer comer o bolo e ficar com ele, é simples de perceber, mas tudo o que nos rodeia nos diz insanamente o contrário. Mas que não haja ilusões, viver é abdicar, de consciência tranquila não só com por aquilo que somos mas, principalmente, com por aquilo que não somos.
Independentemente de tudo o resto, da nossa religião, das nossas convicções, das circunstâncias da nossa vida, da opinião dos outros sobre o que nós somos, todos nós em determinado momento das nossas vidas todos vamos ter que enfrentar um derradeiro julgamento: esse é o julgamento de nós próprios sobre o que fizemos com a nossa vida. E esse pode ser o julgamento mais duro de todos os juízos que temos de enfrentar. E, em última instância, a nossa primeira responsabilidade é viver a vida para em consciência conseguirmos um dia sentir-nos orgulhosos com o veredicto desse supremo julgamento.
Só existem dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã, portanto hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver.
Dalai Lama
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