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rua do imaginário

Porque existe algo em vez do nada?

Porque existe algo em vez do nada?

rua do imaginário

07
Jan22

Breviário do Silêncio

O silêncio não é explicável. Não só porque se furta aos princípios de articulação da linguagem, mas também porque ele é, em si e quando irrompe e se demarca do som, uma realidade e uma experiência auto-suficiente e autónoma. Qualquer tentativa de explicação da experiência (não do fenómeno!) do silêncio seria uma contradição. O silêncio propicia, em última análise, o acesso a uma «fala» do mundo e das coisas na sua radicalidade ontológica, sem explicações. É a pura presença.

 

Breviário do Silêncio, João Barrento.png

João Barrento, Breviário do silêncio, Alambique

 

26
Nov21

A viagem acabou

 

Não é verdade. A viagem não acaba nunca. Só os viajantes acabam. E mesmo estes podem prolongar-se em memória, em lembrança, em narrativa. Quando o viajante se sentou na areia da praia e disse: “Não há mais que ver”, sabia que não era assim. O fim de uma viagem é apenas o começo doutra. É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na primavera o que se vira no verão, ver de dia o que se viu de noite, com sol onde primeiramente chuva caía, ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e para traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já.

José Saramago, Viagem a Portugal

 

IMG_0849.jpg

 

28
Jul21

O banal não existe

A banalidade é uma obra terrivel dos nossos olhos.

 

Teixeira de Pascoaes (1877 - 1952)

 

Pascoaes, que se definiu como "homem cabisbaixo, sisudo, com uns olhos tristes e espantados", sabia bem que conseguir manter o espanto perante o mundo, saber resistir ao banal, é o um dos segredos da sabedoria de viver.

 

 

15
Jul21

“Esta é a tua Igreja”

 

IMG_8292.jpg

Gorongoza, 2009

 

No documentário “Mia Couto - Sou Autor do Meu Nome”, de Solveig Norlund, o escritor e biólogo moçambicano refere que quando em criança foi visitar a Gorongoza com o seu pai, e perante a imensidão e a grandiosidade da paisagem africana, este lhe dizia: “Esta é a tua Igreja”.

É de uma enorme sabedoria reconhecer que a Natureza, a vida em todo o seu esplendor, a improvável maravilha deste planeta, deva ser o nosso primeiro templo, o local onde pertencemos, onde somos humildes e onde devemos recordar e agradecer pelo mistério da nossa existência.

Escrevi em tempos sobre a ideia da utilidade da existência de templos para ateus.  Afinal, talvez seja mesmo este o templo, que deve unir de igual forma ateus e crentes, o que mais falta nos faz.

 

23
Abr21

"Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira"

Esta é a notória primeira frase do romance Anna Karenina, de Tolstoi. Este é também um dos motes do romance de Afonso Cruz, “Princípio de Karenina”. É uma longa carta de um homem a uma filha que nunca conheceu. Uma carta de despedida. Um homem que foi educado a ter medo da diferença, do que nos é estranho, do que vem de fora de nós. Para ele a distância media-se em phobos, em medos. Mas que acaba por se apaixonar pelo que de mais estrangeiro poderia existir, pelo arquétipo da distância, uma mulher da Conchichina.  Uma nota também para as belas fotos do autor que acompanham esta edição.

 

Sabemos bem que em quase tudo só há uma forma de estarmos certos e infinitas maneiras de estarmos errados. Mas, como bem salienta Afonso Cruz, com a felicidade não é bem assim. Há muitas formas de se ser feliz, ao contrário do que refere a frase mote deste livro. A própria tristeza pode ser uma excelente lugar para se ser feliz. O mundo perfeito não existe para ninguém, há quem tenha vidas melhores, há quem tenha vidas piores, há quem tenha vidas tão difíceis que nem as conseguimos imaginar. Mas, isto é certo, todos nascemos para sofrer, nesse aspecto todos somos iguais. O que nos distingue é que alguns de nós, por alguma razão, conhecem a alquimia de extrair a felicidade da efémera, sempre imperfeita, mas maravilhosa improbabilidade que é sentirmos o tempo.

 

Parece-me que Abraham Lincoln conseguiu resumir bem o que é isto de se conseguir ser feliz:

As pessoas são, em geral, tão felizes quanto decidem ser.

 

O princípio de Karenina, Afonso Cruz.jpg

Livro: Princípio de Karenina, Afonso Cruz, Companhia das Letras

 

08
Jan21

O Aroma do tempo

“O Aroma do Tempo, Um ensaio filosófico sobre a Arte da Demora” do filósofo Byung-Chul Han é uma interrogação sobre como vivemos o Tempo no nosso tempo. Vivemos tempos velozes. E sabemos que é preciso tempo para aprofundar o pensamento, ou, na feliz expressão do autor, a “amplidão do Ser”. A comtemplação oferece-nos tempo, a velocidade retira-nos tempo. E sem tempo apenas navegamos na superfície, ao sabor das correntes e dos ventos, num quotidiano permanentemente reativo. A sabedoria exige tempo. E a vida moderna, na sua agitação, na elevação dos ocupados, dos que andam em permanente pressa, onde tudo tem que ter retorno imediato, onde não se espera, impede ver o detalhe do que se esconde para além do óbvio de todas as coisas. E a beleza maior do mundo está no detalhe.

 

Todos vós, que amais o trabalho selvagem e o rápido, o novo, o estranho, suportai-vos mal a vós mesmos, a vossa diligência é fuga e vontade de esquecimento do vosso próprio ser. Se acreditasseis mais na vida, lançar-vos-íeis menos no instante. Mas não tendes em vós conteúdo bastante para a espera – e nem sequer a preguiça!

Friedrich Nietzsche

 

A demora contemplativa concede tempo. Dá amplidão ao Ser, o que é algo mais do que estar ativo. Quando recupera a capacidade comtemplativa, a vida ganha tempo e espaço, duração e amplidão.

(...)

À falta de sossego, a nossa civilização desemboca numa barbárie. Em nenhuma época foram mais cotados os ativos – quer dizer, os desassossegados. Entre as correções necessárias que devem introduzir-se no caráter da humanidade, conta-se portanto, uma ampla medida de fortalecimento do elemento contemplativo.

Byung-Chul Han

 

O Aroma do Tempo, Byung-Chul Han.jpg

O Aroma do Tempo, Byung-Chul Han

 

16
Nov20

Acima de tudo, o que mais importava era o que era verdadeiro

Da mesma forma em que não é possível mentir em nenhum de dezenas de milhares de passos necessários para nos levar à Lua ou a outros planetas, porque todos os passos em todas as missões têm que ser verdadeiros para ela ter êxito, não podia haver mentiras neste novo mundo que que partilháva-mos. Ambos sabíamos que a nossa felicidade dependia da nossa integridade um com o outro e que mesmo uma pequena mentira seria uma forma de separação, por insignificante que fosse. Tudo o que fazíamos juntos tornava-se mais uma maneira de fazer amor.

 

Ann Druyan sobre a sua relação com Carl Sagan, Cosmos - Mundos Possíveis, Ann Druyan, edição: Gradiva

 

26
Out20

Mundos possíveis

“Cosmos – Mundos Possíveis" de Ann Druyan é um livro, e uma serie de televisão, sobre o esplendor do Universo mas, e principalmente, sobre a maravilhosa aventura do conhecimento da Humanidade que nos permite conseguir começar a vislumbrar a linguagem em que o Universo está escrito. É uma mensagem sobre a infinita variedade da existência e as enormes possibilidades da inteligência. E é, também, sobre a nossa insignificância individual.

 

No "Terra inabitável" somos cilindrados com dureza pelo egoísmo do Homem que está a levar o planeta a um desiquilibrio catastrófico. Neste "Cosmos  - Mundos Possíveis" recebemos a profunda beleza da maior construção da Humanidade, em que geração após geração, homens e mulheres movidos apenas pela curiosidade vão desbravando a ignorância e construindo a catedral do conhecimento.

 

Mas não é exactamente sobre o livro "Cosmos – Mundos Possíveis", nem sobre a dicotomia magnificiência/inconsciência da humanidade que quero aqui escrever, mas sobre o amor entre Ann Druyan e Carl Sagan. Porque, de entre todos os mistérios do Universo, o amor será sempre o maior e mais belo de todos.

 

Quando nos apaixonámos, para mim foi como descobrir um mundo novo. Um mundo que eu tivera esperança que existisse mas nunca tivera oportunidade de ver. Neste novo mundo a realidade excedia a fantasia em todos os sentidos.

(...)

Numa noite estrelada, juntos num convés de um navio no Pacífico, vimos um casal de golfinhos a acompanhar-nos. Ficámos a vê-los talvez durante dez minutos quando de súbito, num único movimento gracioso, deram um mergulho em ângulo recto e desapareceram no mar profundo. Moveram-se em uníssono, como se tivessem comunicado de alguma maneira misteriosa. Carl olhou para mim e sorriu: “Somos nós, Annie”, disse ele.

 

Cosmoa - Mundos Possíveis, Ann Druyan.jpg

Cosmos - Mundos Possíveis, Ann Druyan, edição: Gradiva

 

 

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