O tempo não existe, somos nós que o fazemos
Pois não era mais humano
morrer por um bocadinho,
de vez em quando,
e recomeçar depois,
achando tudo mais novo?
José Gomes Ferreira, Viver sempre também cansa!, 1931
Nada nos é tão precioso nem tão íntimo como o tempo, o nosso tempo, neste instante de existência perdido na eternidade. Para se ser feliz tudo o que é preciso é estar em paz com o tempo, essa criação individual, essa ilusão íntima criada para unir um fluir de eventos. Não existe nenhum pêndulo Universal a impor-nos o ritmo do tempo, esse ritmo é só nosso e é único.
A previsibilidade das nossas rotinas de vida, a repetição de horários, a ausência de surpresa e a habituação ao que nos acontece, tudo isto contribui para aumentar a sensação de velocidade com que o nosso tempo passa. Quando estamos num ambiente diferente do habitual, numa viagem, numa experiência nova, perante o que nunca experimentámos, do inesperado temos a noção de que o tempo passa mais devagar. A nossa mente está a absorver o que nos rodeia e temos a clara sensação de que o tempo decorre mais lentamente.
Será então solução evitar as rotinas? Receio que seria tarefa impossível. Porque a rotina é também ela uma criação da nossa mente. A ausência de rotina vai ser ela própria uma rotina, quer queiramos quer não, mais cedo ou mais tarde.
Como travar a velocidade do tempo? Morrer um bocadinho de vez em quando para depois achar tudo mais novo, como escreve o poeta, não nos é possível. Mas é possível estar focado no presente e mantermos a mente admirada com tudo o que nos rodeia. Estar grato por cada segundo em que estamos vivos. Olhar para o mundo com os olhos de uma criança, espantados com o que nos rodeia, com a beleza que há em tudo. É tão fácil manter um sentimento do maravilhoso perante o Universo. Em tudo há beleza e mistério se estivermos dispostos a reparar nisso. Só a sabedoria de manter uma alma espantada perante o mundo nos pode salvar da voragem alucinante do tempo.